[2013] Entrevista com Jon Rose

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Neste domingo, 22 de março, foi celebrado o Dia Mundial da Água. Aproveito a oportunidade para relembrar a entrevista que tive o imenso prazer de fazer em 2013 com Jon Rose, fundador da organização Waves For Water.

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Para nós, que temos acesso ao que é necessário à sobrevivência de qualquer ser humano, é difícil imaginar como é a vida daquelas pessoas que vivem sem água potável, por exemplo. Pois é, mas o fato é que uma criança morre no mundo a cada 15 segundos pela falta deste bem natural, que deveria estar à disposição de cada pessoa no mundo. E é uma ilusão pensar que isto não ocorre no Brasil.

Mas alguém vem travando uma luta contra a falta de água potável. Jon Rose, que dedicou 13 anos de sua vida ao surf profissional, iniciou em 2009 as atividades da organização Waves For Water, que tem como objetivo levar água potável a cada pessoa no mundo que precisa. Ele vem viajando por todo o mundo e apenas em sua última passagem pelo Brasil ajudou cerca de 85 mil pessoas a conseguirem o acesso à água potável com o projeto “Sede de Vencer”, em parceria com o Instituto Projeto Neymar Jr., que visitou comunidades carentes nos locais em que a Seleção Brasileira disputou a Copa das Confederações.

Nesta entrevista exclusiva Jon conta como criou o Waves For Water, fala de suas viagens, da parceria com o jogador Neymar Jr., de sua visão sobre o problema que é a falta de água potável e os caminhos para cumprir seu maior objetivo.

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Zinabre: Jon, em primeiro lugar, você foi um surfista profissional e viajou por todo o mundo, teve contato com pessoas e culturas diferentes. Como esse estilo de vida te levou a criar o Waves For Water? Como este projeto surgiu?

Jon: Eu passei 13 anos como surfista profissional. Competi no World Tour por cerca de metade desses anos, e o restante foi dedicado a explorar ondas em locais remotos. O Waves For Water foi fundado na intenção de ir e fazer o que você ama, e ajudar ao longo caminho. Ele seria nada mais do que um projeto que me levaria de volta a alguns dos lugares mais carentes e remotos que eu tinha ido como um surfista profissional. Era uma maneira de finalmente voltar lá e retribuir com algo, mas, honestamente, surfar lá novamente… Eu não tenho problemas de admitir a natureza egoísta em que toda essa ideia surgiu.

Mas, então, eu estava em uma viagem para a Indonésia, que era realmente apenas qualquer outra viagem de surf com os amigos, mas no fim eu tinha planejado ir para outra ilha próxima que eu conhecia, distribuir 10 filtros portáteis de água e lançar oficialmente o W4W. Porém eu fui pego em um terremoto na cidade de Padang, Sumatra, antes que eu chegasse a esta ilha e me tornei um socorrista – distribuindo os 10 filtros para os centros de socorro de lá.

Foi uma experiência do tipo que altera a vida e que me ensinou muitas coisas, em primeiro lugar o quão práticas essas soluções (filtros de água) eram e como é grande a necessidade destas soluções. Mas a maior lição foi realmente aprender o quanto uma pessoa pode fazer. Isto mudou minha vida para sempre, e daquele dia em diante eu me foquei no W4W.

ZNB: A propósito, você diria que você criou o W4W, ou ele meio que “surgiu” naturalmente na sua vida?

JON: Veja esta história… Obviamente foi alguma intervenção divina ou algo do gênero que aconteceu…

ZNB: Depois daquela tragédia em Padang, você se envolveu com o auxílio em desastres no Haiti, Chile, Japão… Tsunamis, terremotos e inclusive o Furacão Sandy, que atingiu Nova Iorque e Nova Jersey. Qual destas situações ou lugar te tocou mais? Por que?

JON: Cada projeto que fazemos é significativo, porque quando está tudo dito e feito, as pessoas tem acesso à água potável, o que não tinham antes. Então, para mim é verdadeiramente medido pela ação a única coisa que muda de projeto para projeto é a escala em que é feito.

ZNB: Você esteve em lugares muito necessitados, sendo já mais de 20 países, e é um fato que uma das condições mais degradantes pelas quais um ser humano pode passar é a falta de água potável. Em geral, qual é a causa deste problema? Ambiental, social, financeira? (Quem sabe todas juntas?)

JON: A principal razão é essencialmente econômica/social. É lamentável, mas com a evolução de nossa espécie temos esgotado nossos recursos naturais e transformado o que um dia foi livre e prontamente disponível em um tipo de mercadoria. Uma vez que isso aconteceu, houve uma separação de classes e algumas pessoas deixaram de ter atendidas suas necessidades humanas básicas.

ZNB: Você recentemente se juntou à maior estrela do futebol brasileiro, Neymar Jr., e seu Instituto para realizar o projeto “Sede de Vencer”, levando água potável a comunidades carentes do Brasil. Como surgiu esta parceria?

JON: Sempre houve uma grande relação entre o esporte e o Waves For Water, e provavelmente sempre haverá. Devido à minha experiência pessoal, eu vou sempre ver as coisas através de algum tipo de “lente” baseada no esporte – é como eu me relaciono e começo a resolver problemas. Porque um jogo ou qualquer atração esportiva é apenas uma série de problemas ou desafios que precisam ser resolvidos ou superados.

Dito isto, a parceria no Brasil com o fenômeno do futebol Neymar Jr. e seu Instituto já resultou em 85 mil pessoas recebendo acesso à água potável. Chamamos o projeto de “Sede de Vencer” e ele é inteiro baseado em torno da água e do esporte.

A filosofia principal por trás do W4W sempre foi “vá, faça o que você ama e ajude ao longo do caminho”, e é exatamente isso que foi feito! Neymar está lá fazendo o que ama, jogando futebol, e ao mesmo tempo, através de nosso programa, está ajudando todas as comunidades por onde passa. É realmente um grande exemplo do nosso modelo de trabalho. Definitivamente, nós desenvolvemos este modelo com a esperança de que ele poderia ser conectado a todas as classes e estilos de vida – não apenas com surfistas ou viajantes aventureiros, mas também com jogadores de futebol, músicos, fabricantes de roupas, chefs de cozinha e cineastas, apenas para citar alguns. Realmente qualquer um que esteja viajando por aí, por qualquer razão.

Quero aproveitar e fazer um agradecimento especial a Baruel, Hurley H2O e Loducca por terem dado suporte e tornado este projeto possível, pois sem eles tudo isto não teria acontecido.

ZNB: Depois de visitar países onde sabemos que há sérios problemas com água potável, como você vê o Brasil em um contexto global, neste tema?

JON: Embora passe por um rápido desenvolvimento econômico, o Brasil ainda está longe de ter uma infraestrutura sólida… Há pontos no país em que este desenvolvimento já começou, mas o que realmente define um país como “desenvolvido” é a infraestrutura dele como um todo. Assim, qualquer país que não tenha este nível geral de infraestrutura e, mais importante, um grande percentual de pessoas vivendo na linha da pobreza ou abaixo dela precisa do nosso programa. Enfim: o Brasil é mais promissor do que outros países em que trabalhamos, mas as necessidades neste momento ainda são as mesmas.

ZNB: Especialmente no Brasil, a necessidade de água potável e o fim das secas já foram temas de inúmeras promessas não cumpridas por políticos. Em outros países acontece a mesma coisa? O que você pensa sobre isso?

JON: Sim, é a mesma história em praticamente todos os países em que trabalhamos. A água, por ser tão vital a nossa sobrevivência, representa poder e então vai ser sempre utilizada como uma arma política. Mas existem sempre maneiras de contornar isto, e sempre começa pela educação.

ZNB: Você provavelmente viu os protestos que o povo brasileiro vem fazendo contra seus governantes. Você consegue ver alguma relação entre este tipo de mobilização popular e projetos como o Waves For Water, preocupados em melhorar a qualidade de vida da população?

JON: Absolutamente… Eu sinto que a água potável (por exemplo) não é um luxo, mas sim um direito humano. Eu sinto que simplesmente por nascer temos o direito a alimentos, água e abrigo. Não estou dizendo que isso deveria nos ser dado por algum “poder superior”. Essa crença vem da ideia de que a terra FORNECE estas coisas, portanto, elas não são um luxo.

Nós podemos usar água da chuva ou encontrar no solo, nós podemos cultivar vegetais e frutas ou caçar para comer, e nós podemos construir um teto sobre nossas cabeças. Entendo que estou falando idealisticamente, mas o princípio fundamental é ao que estou me referindo. A sociedade mudou e não é tão fácil fazer as coisas que acabei de citar, mas ainda tenho esta luz de guia enquanto eu tento enfrentar a crise global da água potável.

ZNB: Seu objetivo é “levar água potável a toda pessoa que precise”. O quanto você acha que está perto de alcançar este objetivo?

JON: Sim, o nosso objetivo é conseguir água potável para cada pessoa que precisa e o Waves For Water trabalha nas linhas de frente para fornecer a água potável às comunidades carentes por todo o mundo. É difícil dizer quando seremos capazes de conseguir isso, mas nossa estrutura organizacional e nosso trabalho é construído tentando envolver o máximo de pessoas possível nesta missão. A ideia não é fazer uma pessoa distribuir 100 filtros e ponto, fim do dia. Vamos tentar, ao invés disso, ter 100 mil viajantes carregando cada um dez pequenos filtros, ou se juntar a grupos para implementar projetos com filtros maiores, para uma vila inteira. Então, o mundo vai começar a tomar conhecimento e estaremos muito mais perto deste objetivo.

Mas o maior ponto que gosto de destacar e lembrar é de sempre pensar neste desafio de forma descentralizada – uma forma viral… Como um grupo, um movimento, nós podemos resolver este problema… Sozinhos, não.

ZNB: Como você se sente sabendo que já salvou e mudou a vida de tantas pessoas, inclusive crianças, em todo o mundo? Algum dia você pensou que poderia fazer a diferença no mundo?

JON: Obviamente é muito bom saber que estou fazendo a diferença. Mas eu estou menos preocupado em salvar todo mundo e mais focado em apenas fazer a minha parte. Todos tem seu próprio destino para descobrir e as coisas serão como devem ser. Mas eu acredito que para que realizemos nossos destinos, nós precisamos começar o “jogo” do mesmo nível. É tudo o que eu faço: eu ajudo a nivelar o “jogo”.

ZNB: Você sempre fala de “fazer o que ama e ajudar ao longo do caminho”, e criou o W4W por causa do surf. Este esporte ainda faz parte da sua rotina?

JON: O Waves For Water nasceu quando percebi que poderia ir a todos os lugares que conheci surfando e ajudar. O surf e esportes em geral são parte do DNA do W4W, e o surf será sempre uma parte de minha vida.

Zinabre: Para encerrarmos: Você tem planos de voltar ao Brasil com o Waves For Water? Talvez durante a Copa do Mundo no ano que vem, com outro projeto como o “Sede de Vencer”?

Jon: Sim, eu vou voltar! Temos muitos projetos em que estamos trabalhando no Brasil e eu suspeito que estarei aí por muitos anos ainda. E sim, o “Sede de Vencer” está se preparando para a sua segunda fase, que provavelmente será iniciada nos próximos seis meses.

E realmente não demoraria para Jon Rose voltar ao Brasil. Pouco tempo depois desta entrevista, o Waves For Water firmou uma parceria com a Mitsubishi para participar do Rally dos Sertões. A equipe, é claro, trará os filtros de água para distribuir pelas comunidades carentes pelas quais passarem no trajeto do rally, que compreende parte dos estados de Goiás e Tocantins.

O Zinabre agradece a Jon Rose por sua atenção e deseja sucesso neste grande objetivo no qual se engajou. O mundo precisa de mais pessoas que dediquem suas obras a quem precisa, sem falsas promessas ou ilusões em busca de lucros.

Conheça mais sobre o Waves For Water:
Site oficial
Vídeos
Instagram: @wavesforwater e @jon_rose

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